Duas primeiras-damas, duas vozes e dois caminhos
Por Sebastião Silva
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Esses dias, enquanto tomava meu café com pão passado na frigideira, como sempre faço quando acordo antes do sol, ouvi no rádio uma notícia que me fez levantar a sobrancelha. Diziam que a primeira-dama do Brasil, Janja, havia provocado certo burburinho durante um encontro oficial com o presidente da China. Parece que, numa fala espontânea, criticou o TikTok — justo uma plataforma chinesa. Comentou que ali circulavam conteúdos perigosos, voltados à desinformação e ao extremismo. E bastou isso pra movimentar os bastidores diplomáticos.
Confesso que não sou de acompanhar de perto o noticiário político, ainda mais quando se trata de assuntos que parecem distantes da nossa cidade. Mas depois que a aposentadoria chegou, e com o neto correndo pelo quintal, comecei a prestar mais atenção em certas coisas. Tem notícia que parece longe, mas revela muito do que acontece por perto — e nos diz mais do que parece.
Não por julgamento. Cada pessoa tem seu jeito de agir, especialmente quem compartilha a caminhada com alguém que carrega o peso do poder. São figuras que, mesmo sem mandato, influenciam decisões, moldam gestos e representam muito mais do que o título sugere. Cada uma tem seu tom, sua história, sua maneira de se fazer presente. E foi essa diferença que me chamou atenção.
Aqui em Goiás, a primeira-dama Gracinha Caiado atua de forma mais reservada. Está onde o social precisa de estrutura — nas unidades de acolhimento, nas articulações com prefeitos, no lançamento de programas de saúde e assistência. Um exemplo disso foi o empenho em trazer no mês passado, o Restaurante do Bem aqui para Aparecida. Esta semana mesmo, vi que ela esteve no canteiro de obras do Hospital Cora, voltado ao tratamento de câncer. Sem muito alarde, ajudou a articular parcerias, incluindo uma doação do DJ Alok. Fez o que precisava ser feito — sem discurso longo, mas com presença firme.
Enquanto isso, lá em Brasília — e pelo mundo — Janja parece buscar um espaço diferente. Entra com coragem em ambientes que ainda são pouco abertos à participação ativa de mulheres. E sejamos justos: não é fácil. Quando uma mulher se posiciona, qualquer frase ecoa mais alto do que deveria. Se fala, dizem que exagerou. Se se cala, acham que se omitiu. Se se envolve, rotulam. Se recua, subestimam. É um caminho cheio de desvios, e o julgamento chega antes mesmo da explicação.
A verdade é que cada uma trilha um percurso coerente com sua visão de mundo. Gracinha tem longa experiência ao lado de um político de trajetória consolidada. Conhece os bastidores, entende os silêncios, e usa isso pra fortalecer ações sociais concretas. Já Janja carrega outra inquietação — é socióloga, militante, articulada. Quer estar presente com voz e opinião. E isso, embora incômodo pra alguns, também tem seu valor.
Não penso que uma esteja certa e a outra errada. São estilos. São formas distintas de exercer influência. Enquanto uma age pelas beiradas e entrega resultado sem barulho, a outra encara os holofotes e se arrisca a levantar temas difíceis. Não se trata de medir quem fala mais ou menos, mas de observar o alcance de cada gesto.
Dona Maria, minha mulher, costuma dizer que o poder é um campo minado: exige tato, mas também exige coragem. E isso vale pra qualquer pessoa, homem ou mulher. Tem quem prefira a costura fina, e tem quem prefira o corte direto. O que não pode faltar é propósito. E, principalmente, consequência.
Quando vejo uma articulando a entrega de roupas, alimentos e mutirões de cirurgia, reconheço um trabalho que chega rápido, na linha da frente. Já quando a outra confronta plataformas digitais ou figuras poderosas, percebo uma atuação que tenta proteger a sociedade num plano mais amplo — talvez mais lento, mas igualmente importante. Uma trabalha no imediato, a outra no estrutural. E o país precisa das duas.
Porque o espaço político, mesmo que simbólico, precisa de mais vozes. De vozes que tragam propostas, que provoquem, que sejam ponte entre o que se discute e o que se sente. Vozes que saibam quando falar, mas também quando escutar. E que não sejam silenciadas apenas por não seguir o roteiro que esperavam delas.
Hoje vejo que não basta estar ao lado do poder. É preciso saber por que está. É preciso propósito, humildade pra aprender e coragem pra agir. E isso vale pra qualquer um — com ou sem cargo, com ou sem título. O povo observa. Mas é no tempo, e nos frutos, que se revela quem está realmente plantando alguma coisa.
Entre Gracinha e Janja, o que vejo são duas mulheres tentando fazer diferença em ambientes que nem sempre as escutam. Uma com passos silenciosos e firmes, outra com gestos mais visíveis e provocadores. Nenhuma está parada. E nenhuma está errada. Ambas estão tentando. E só por isso, já merecem respeito.
Torço pra que sigam em frente. Que ampliem seus espaços, que sejam reconhecidas por seus méritos e que inspirem outras mulheres a ocuparem também esses lugares onde ainda se exige tanto — e se permite tão pouco.
Porque o futuro não se constrói apenas com presença. Se constrói com propósito.

Escrito Por Sebastião Silva
Aos 65 anos, Sebastião carrega nas mãos a memória de uma cidade inteira. Chegou em Aparecida no fim dos anos 70, quando tudo ainda era barro e promessa. Foi serralheiro por décadas até se aposentar — cada portão, cada grade, um pedaço da sua história. Entre a missa e o noticiário, não se cala: cobra, opina, representa quem construiu Aparecida com suor.
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