A pressa que tira a vida

sebastiao

Essa semana fui dormir pesado. A notícia chegou no fim da tarde: três jovens perderam a vida num acidente aqui em Aparecida. O carro em que estavam cruzou a avenida em alta velocidade e bateu de frente com um caminhão. Um quarto rapaz foi levado pro hospital em estado grave. Tão novos… ainda com a vida inteira pela frente.

Parece que estavam fugindo de outro acidente, como se o primeiro erro empurrasse para um segundo ainda mais trágico. E eu fico aqui pensando como tudo anda tão acelerado. Gente que vive correndo pra chegar, pra não atrasar, pra dar conta, e às vezes nem percebe que corre também pra morrer.

Nos últimos tempos, tenho notado um número cada vez maior de cruzes novas pelas calçadas e margens das avenidas. Jovens de moto, de bicicleta, até a pé. Vidas interrompidas não pela má sorte, mas por um trânsito que virou campo de guerra. A gente sai de casa sem saber se volta.

Lembro que quando eu era novo, no tempo em que Aparecida ainda engatinhava no asfalto, dirigir era um ato de paciência. Não tinha radar, não tinha pressa, e carro era luxo. Hoje, o asfalto melhorou, mas parece que o juízo de alguns ficou pelo caminho. As pessoas pisam fundo como se a cidade fosse pista de corrida, e esquecem que cada cruzamento carrega uma família esperando alguém voltar.

Esses meninos de agora, tão cheios de sonhos, estão se perdendo num mundo que cobra pressa, mas não ensina a parar. Muitos aprendem a dirigir antes mesmo de entender o peso da responsabilidade de um volante. E a cidade, crescida e espalhada, precisa urgente de mais educação no trânsito, de campanhas, de exemplo.

A verdade é que Aparecida tem se transformado, e com ela os riscos. Só que, nesse ritmo, a gente perde o essencial: a vida. A mãe que esperava o filho chegar pra jantar. O pai que mal teve tempo de ensinar o menino a trocar o pneu. Os amigos que ficaram com o celular na mão, vendo a última mensagem sem resposta.

A dor dessas famílias não tem tamanho. E não adianta procurar culpado depois que o caixão desce. A pergunta que fica é: o que nós, como cidade, estamos fazendo para evitar que a próxima tragédia aconteça?

Eu gostaria de ver mais campanhas nas escolas, mais blitz educativas e menos fechamentos relâmpago só pra arrecadar multa. Queria ver mais empatia no trânsito, mais gente dando passagem, menos buzinando com raiva. E principalmente, ver nossos jovens entendendo que o volante não é videogame e que a vida real não tem botão de reinício.

Na próxima vez que ouvir o ronco de um motor disparando pela avenida, eu sei que vou sentir um arrepio. Porque cada arrancada dessas me lembra que, por trás da velocidade, mora o risco. E que por mais que a juventude pareça eterna, ela é frágil demais pra brincar com a morte.

Tomara que, diante dessa dor, a gente aprenda. Que a cidade se levante com mais cuidado, que os pais conversem com seus filhos, que os motoristas se respeitem, que os meninos pensem duas vezes antes de acelerar. Porque nenhuma pressa vale uma vida. E nenhuma lágrima consegue desfazer o que o tempo atropelou.

Escrito Por

Aos 65 anos, Sebastião carrega nas mãos a memória de uma cidade inteira. Chegou em Aparecida no fim dos anos 70, quando tudo ainda era barro e promessa. Foi serralheiro por décadas até se aposentar — cada portão, cada grade, um pedaço da sua história. Entre a missa e o noticiário, não se cala: cobra, opina, representa quem construiu Aparecida com suor.

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